quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Crônica para o fim de agosto

Eu quero te pedir desculpas. Talvez soe um tanto patético por ser tão tarde, mas eu preciso te pedir desculpas. É que subir ouvindo aqueles fogos me calou. Estanquei-me diante da impotência que essa minha falha nos causou. Falha sim, omissões sempre serão falhas também: o bem que deixamos de fazer, o amor que adiamos para expressar.

Caramba, você andando ali do meu lado e o coração doendo cada vez mais. Assumo a culpa agora. Desculpe a minha geração por ter acordado tarde demais. Desculpe também aqueles mais atrasados, que ainda dormem eternamente em berço esplêndido.

Desculpe-me por ter guardado os sonhos em caixas difíceis de organizar. Desculpe-me por ter demorado tanto para ouvir os barulhos na varanda e os doces latidos. Desculpe-me por deixar para depois o começo da terapia, e por protelar a busca por algo que verdadeiramente preenchesse o vazio das noites de terça. Adiar tudo isso me emperrou, você consegue ver? Como amarga enxergar essas pequenezas que poderiam ter despertado mais cedo uma pessoa melhor.

Peço desculpas com vergonha também, entende? A gente cansava de bater no peito, orgulhosos por ser alienados, por odiar política e não se importar. Mas olha, eu quero correr atrás do prejuízo. Será que ainda dá tempo? Para tentar compensar, prometo estar de olhos mais abertos, questionamentos na ponta da língua e com disposição para encarar as lutas. Posso garantir também levar mais a sério o que pode ensinar algo e procurar sempre me informar. Para ajudar um pouco, aprendi novas palavras, como dizia Drummond. Feminismo, empatia, direitos, humanos.

Em tempo, desculpe mesmo a minha geração. No meio da tralha da herança de desigualdades, violência e falta de amor, é possível avistar tesouros. Encontrei mãos que apontaram caminhos e outras que, num gesto simples, apenas se entrelaçaram às minhas. Nunca se engane: unidas elas constroem pontes e desconstroem preconceitos. Elas até tornam algumas palavras mais belas também, Drummond. Gratidão, encontro, irmão.

Eu sei, está dando um medo. Muito mesmo. Mas, desde sempre, você me ensinou a compartilhar. Então, não solta da minha mão.

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